Primeira etapa concluída – Trinidad e Tobago O olho atento às velas e ao rumo. A cada três horas ocorre a mudança de turno e Diogo e Flávio se revezam continuamente. Apesar dos pequenos percalços e dificuldades inerentes à navegação, a tripulação do Itusca não pode reclamar. Afinal, conseguiram uma média acima do normal de ventos favoráveis. O barco sacode e balança e, como estão longe de terra, a dupla só pode imaginar as curvas e encantos da Bahia ficando para trás. Por mais de 1500 milhas navegadas desde Florianópolis, Diogo e Flávio não cruzaram com nenhum outro veleiro no caminho e, por isso, ficaram contentes ao se aproximarem de Recife, onde sabiam que um considerável grupo de velejadores aguardava o início da Refeno (regata Recife – Noronha). Em Salvador haviam encontrado o velejador Crespo que foi uma referência e inspirou a dupla a viajar pelo mundo de veleiro. São todos parte de uma enorme comunidade informal e, pensar assim, trás conforto para Diogo e Flavio. Rafael, que havia acompanhado a dupla de Floripa até ali, resolve que chegou o momento de retornar para casa. Despedidas são sempre tristes, embora desta vez a dupla restante foi mais do que recompensada logo em seguida. De surpresa chegaram Mailyn, esposa de Diogo e Daniela, namorada de Flávio. Uma boa troca, uma cueca por duas calcinhas! Velejar o nordeste com suas mulheres iria realmente fazer com que a viagem fosse ainda mais inesquecível. Nada melhor do que o mar para aproximar ainda mais um casal apaixonado. De Recife, sob a proteção da lua cheia o quarteto seguiu rumo à João Pessoa. Flávio e Dani se aconchegam no cockpit e, em silêncio, contemplam a noite tranqüila. Horas mais tarde Mailyn e Diogo observam o nascer do sol. Um brilho de segurança para marinheiros de primeira viagem, mas no caso de marinheiros experientes, apenas um símbolo na contagem de dias no mar. “Às vezes me considero experiente e lembro de todas as experiências que passei no mar. Mas outras vezes me sinto tão pequeno e impotente”, revela Diogo. No Jacaré, em João Pessoa, a tripulação é presenteada com um pôr do sol magnífico. “É, talvez, o pôr do sol mais bonito do Brasil”, comenta Flávio. Mas como a vida de marinheiro é uma vida nômade, o Itusca segue em frente, rumo à Natal. É quando, finalmente, aporta sem perder tempo, todos saem para passeios de bugue e caminhadas. Visitam Pipa e também as dunas do norte da cidade. Dizem que numa volta ao mundo de veleiro, caminha-se duas voltas. Para cada milha de barco, o velejador caminha duas... Mar novamente. Agora numa travessia um pouco mais longa de dois dias. As meninas, um pouco menos acostumadas se adaptam bem, mesmo com o mar mexido e o vento fresco. Fortaleza desponta no horizonte. Aportam no Marina Park Hotel, e são recebidos de forma mais do que especial pelo amigo e também velejador Gil Bezerra, proprietário do hotel. Excelente anfitrião, Gil os leva para diversos pontos turísticos e por alguns dias Diogo e Flávio puderam esquecer um pouco a longa travessia que teriam pela frente a partir de Fortaleza até o Caribe. Mas o dia chegou e com o coração apertado se despedem de suas mulheres, guardando os dias memoráveis num local especial na mente. Agora teriam 1700 milhas náuticas pela frente. Possivelmente mais de 10 dias no mar. O vento sopra favorável e com ótima intensidade. Desta forma o Itusca singra nos primeiros dias com ótima velocidade. Passam um, dois, cinco dias e de repente uma vasta calmaria consome tudo ao redor. Próximo da linha do Equador o mar parece um azeite e o calor sufoca Diogo e Flavio. “A sensação numa longa calmaria é muito ruim. O calor nos causava dor de cabeça e não saber quanto tempo você vai ficar ali boiando é muito angustiante” – diz Diogo. Para passar o tempo Flávio solta uma linha com currico. A linha mal estica e lá está um belo atum se debatendo. A linha volta para a água e em seguida um dourado, e depois um atum, e outro atum e finalmente uma barracuda. Chega! Em vinte minutos 5 peixes é demais. Por 4 dias Diogo e Flávio comem o peixe pescado e bebem a água do seu dessanilizador. “Aquilo é que era independência. O mundo podia acabar e nós ainda estaríamos vivos por um bom tempo” – comenta Flávio. A calmaria perdurou por cinco dias e Diogo e Flávio mantiveram a vela balão em cima constantemente para captar qualquer sopro insignificante. O vento de porão (motor) também ajudou, mas o combustível era tão limitado quanto o próprio vento na região dos Doldrums (calmarias intertropicais). Doze sóis enormes e quentes foram contados nascendo e se pondo até que a dupla finalmente chegou a Trinidad and Tobago. Uma longa jornada que conclui essa primeira etapa da viagem de volta ao mundo. Floripa até Trinidad. Em breve seguem para o restante do Caribe e para o Panamá.
Chagada ao Caribe Chega ao fim a primeira parte da viagem. "Depois de 2 meses de viagem chegamos a ilha caribenha de Trinidad e Tobago. O trecho da costa Brasileira foi excelente, com ventos a favor quase que o tempo todo", diz Flávio. Aconteceram alguns problemas técnicos no barco, como consumo de bateria excessivo, quebra do piloto automático (duas vezes), curto no inversor e em duas bombas de porão, entre outros pequenos problemas que a dupla agradece por terem acontecido na costa do Brasil, pois foi um aprendizado na área de eletrônica muito importante pra eles. "Tivemos dicas de vários velejadores que agradecemos muito. Tivemos a oportunidade de parar em Ilhabela/SP, Rio de Janeiro, Cabo Frio/RJ, Vitória/ES, Abrolhos/BA, Camamu/BA, Morro de São Paulo/BA, Salvador, Recife/PE, João Pessoa/PB, Natal/RN e nosso ultimo porto Fortaleza/CE", diz Diogo. "Salvador foi o primeiro porto que tivemos um verdadeiro contato com os velejadores, muitos barcos estavam subindo para Refeno e esperavam la boas condições para seguir viagem. Contatamos Crespo um velejador que nos inspirou nessa aventura, ele foi totalmente atencioso e nos deu varias dicas excelentes" comenta Flávio. "Em Recife, Rafael que estava conosco voltou para Garopaba, porém recebemos as meninas de nossas vidas, Daniela Aguiar, minha namorada e Mailyn Guerreiro, esposa de Diogo, nos fizeram companhia até chegarmos a Fortaleza e transformaram a viagem ainda melhor. Conhecemos Maracaípe com o Big Rider Rato Fernandes, Porto de Galinhas, e Olinda com toda a sua história, uma das cidades mais antigas do País. Tivemos uma atenção especial de nosso grande amigo Marcelo Lacerda e sua família. O velejador Vicente Galo proprietário do trimarã Ave Rara referencia na regata internacional Recife – Noronha, também nos deu um grande suporte na cidade", diz Fávio. Depois de uma noite de travessia e uma impressionante adaptação das meninas ao mar a dupla chega a Cabedelo o porto de João Pessoa/PB, mais exatamente no Jacaré, um dos lugares do Brasil com pôr de sol mais bonito, ao som do Bolero de Ravel tocado com sax em canoa na frente dos bares da região. Mais 80 milhas e 12 horas de viagem o veleiro estava passando por baixo da recém inaugurado ponte de Natal/RN onde sem perder tempo os triplunates sairam para um passeio de buggy pela região. No outro dia, Pipa foi a praia escolhida. A travessia para Fortaleza foi um pouco mais longa, demorando 2 noites e 1 dia de viagem. "Dani e Mailyn sentiram um pouco melhor o que passamos. Estavam desesperadas para pisarem em terra firme", revela Diogo. "Fortaleza foi a cidade onde mais encontramos amigos e tivemos também um grande apoio, Gil Bezerra nos impressionava todo o dia nos acompanhando nos programas mais turísticos da região, como o Beach Park , parque das piscinas na cidade vizinha de Beberibe. Jantamos também com grandes amigos como Dudu Mazocatto, Plínio e Adriano Lavezzo, e o campeão mundial de Windsurf Freestile Marcilio Brow que nos acompanhou junto com o Gil num velejo mais ou menos, mas que matou a fissura, na praia do Pacheco. Compramos nossos suprimentos, muita comida e bebida, diesel nos tanques e água doce, nos despedimos das meninas e de nossos amigos e rumamos a nossa mais longa travessia, 1670 milhas, para Trinidad e Tobago. Agora só o Flavio e o Diogo a bordo do ITUSCA", conta Flávio. "Os primeiros dias de travessia foram ótimos, fizemos cerca de 180 milhas por dia, o mar liso, estava tudo perfeito. Quando chegamos na altura do Oiapoque pegamos em menos de 20 minutos 5 peixes, 3 atuns, 1 dourado e 1 barracuda, devolvemos dois ao mar e nos deliciamos por 3 refeições com os outros. Nos outros dias o vento começou a ser cada vez mais raro, sendo que motoramos quase 5 dias seguidos para podermos chegar ao nosso destino. Usamos muito nossa vela balão sempre que dava ela estava em cima tentando capturar o maximo de vento possível na calmaria interminável", fala Diogo. "Estávamos passando pela zona dos doudrames perto da linha do Equador e as calmarias são seguidas de tempestades com ventos de mais de 30 nós, estávamos tão desesperados por ventos que seguíamos as chuvas para poder desligar os motores por algumas horas. Dia 6 de outubro chegamos a ilha de Trinidad depois de 12 dias de travessia. Aportamos em Chaguarama onde conseguimos um estaleiro para tirarmos o barco da água, minimizando ao máximo as chances de o barco sofrer algum dano por furacões que nessa época assombram o caribe. Dentro de 2 meses soltaremos as amarras do ITUSCA rumo ao Caribe, Grenada. Aguardem!", sufere Flávio.  Relato enviado do barco ITUSCA pelos velejadores Flávio Jardim e Diogo Guerreiro. |